Hans Donner e Globo: saiba como começou a história do designer com a emissora carioca – TV História


Ao longo de seus 53 anos, a Globo mostrou para o mundo a criatividade e o profissionalismo da nossa TV, destacando que inúmeras vezes o trabalho brasileiro não fica atrás do serviço das televisões americanas e europeias. Porém, não foram apenas profissionais brasileiros que ajudaram a Globo a ser o que ela é hoje: um alemão, com cidadania austríaca, inovou com aberturas e vinhetas, criando um logo que marcou a vida dos brasileiros. Estou falando de Hans Donner.
Hans nasceu na Alemanha, em 1948, mas com apenas dois anos de idade se mudou para a Áustria com sua mãe e seus irmãos, após a morte de seu pai. Com 17 anos, começou a estudar em uma das melhores escolas de design da Europa, como a Hohere Graphische Bundeslehr-und Versuchsanstalt, em Viena. Foi nesta instituição que Hans descobriu a sua grande paixão: o design gráfico. Essa paixão o levaria a mostrar o seu talento para o mundo, especialmente em um país bem distante da Áustria: o Brasil.
Lendo uma revista alemã especializada, Hans conheceu o design publicitário produzido no Brasil. Ficou tão encantado e surpreso com a técnica e inovação dos brasileiros nessa área que, naquele momento, teve a convicção de viajar para trabalhar no país. Sua família foi contra: afinal, seria estranho iniciar a promissora carreira em um país de terceiro mundo. Porém, o futuro designer decidiu embarcar rumo ao Rio de Janeiro mesmo assim e dar um tiro no escuro, já que não conhecia ninguém na cidade e tampouco tinha emprego garantido.
Hans foi atrás das agências de publicidade para mostrar seu talento, com seu portfolio debaixo do braço, e apresentar o material produzido ao longo dos anos em Viena. Todos que entrevistaram Hans elogiavam e admiravam o seu trabalho, mas sugeriam que ele buscasse outras oportunidades. Ao chegar a São Paulo, foi à DPZ, e logo apareceu uma oportunidade: um colaborador da agência prestes a ser demitido e Hans seria seu substituto. Confiante, ele voltou para o Rio e de lá esperaria a resposta. A alegria virou decepção: ele tomou um não e estava de fato sem emprego no Brasil.
Pensando em voltar para a Áustria, aceitando que havia dado certo, Hans encontrou no elevador da DPZ o redator Arlindo de Castro, que também havia levado uma negativa da agência. Após uma conversa e um café, o designer apresentou seu portfolio ao redator. Ao ver seu trabalho, Arlindo ligou para o fotografo David Drew Zingg. Sem pestanejar, David levou Hans até a Rede Globo, que ficava próxima ao estúdio do fotógrafo. O austríaco mal sabia o que era a Globo, e também mal sabia que aquela emissora mudaria sua vida.
Ao chegar à Globo, Hans se encontrou com Walter Clark, um dos mais importantes diretores da história da emissora carioca. Naquela época, a Globo não tinha um departamento de arte, mas Hans, logo de cara, seria o responsável por criar este departamento e reformular o visual do canal. Com o contrato na mão, ele teria que voltar para a Áustria e ir ate a embaixada brasileira em Viena para agilizar a documentação para trabalhar e se fixar de vez no Brasil.
No voo que o levava de volta para casa, Hans começou a rabiscar em um guardanapo aquele que seria um dos logotipos mais famosos do Brasil. Como não conhecia quase nada da emissora, o designer desenhou duas esferas, representando o mundo, além de uma tela que transmitia a imagem do próprio globo.

Ao chegar em Viena, ele descobriu que precisaria de outros documentos para trabalhar aqui. Tranquilo, mandou uma carta para Walter Clark pedindo os papeis para voltar à embaixada. Enquanto esperava, Hans desenvolvia todo o trabalho visual com sua equipe. Nesse período, nenhum documento chegava do Brasil, muito menos explicações. Hans começava a desistir, acreditando que nada daria certo e que o seu sonho brasileiro fora por água abaixo. Mas ele foi até o fim e continuou trabalhando para a Globo, mesmo sem uma contratação efetiva.
E, assim, ele voltou ao Rio, com a ajuda de seu irmão que comprou apenas a passagem de ida: era tudo ou nada. Hans foi bater na porta do David Drew Zingg e, novamente, apresentar seu portfolio, agora todo recheado com fotos e até um rolo de filme que tinha uma animação da marca. Voltou para a Globo e mostrou as novidades para Walter Clark que, encantado, pediu para exibirem a animação em uma sala.
Alguns diretores acompanharam o filme e gostaram do que viram, mas Hans disse que, para dar continuidade àquelas vinhetas, precisaria de um profissional de arte, como Rudi Bohm, seu amigo, e de uma câmera especifica, a Oxberry. Um dos presentes perguntou quanto custava e Hans respondeu: “meio milhão de dólares”. A resposta foi direta: “você vai tê-la!”. Quem disse isso era nada mais nada menos que José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni.
Assim nascia uma era moderna na nossa televisão.
Em outubro de 2017, tive a chance de conhecer Hans Donner pessoalmente, no lançamento do livro Biografia da Televisão Brasileira, cuja capa foi criada por ele. Em uma breve entrevista, perguntei de tantos trabalhos feitos para a Globo, qual mais lhe agradava, e essa foi a resposta: “São muitos! O logo da Globo, obviamente, foi a chave que abriu o paraíso! Dos trabalhos de televisão, com certeza, as aberturas do Fantástico, que fizeram a Globo se tornar conhecida e respeitada no mundo inteiro. [A novela] Deus Nos Acuda, que é a situação que vivemos hoje e que sonhei há 25 anos atrás, com a lama invadindo a festa… Ah, e com certeza as vinhetas do carnaval, onde pude unir meu design com o design de Deus”.



Fábio Marckezini é jornalista e apaixonado por televisão desde criança. Mantém o canal Arquivo Marckezini, no YouTube, em prol da preservação da memória do veículo. Escreve para o TV História desde 2017 Leia todos os textos do autor
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